Debate durou quase duas horas e prevaleceu na CMC a opinião que a inclusão da data no calendário oficial de Curitiba era importante para a cidade.
Com 28 votos a favor, 2 contrários e 5 abstenções, a Câmara Municipal de Curitiba (CMC) aprovou, nesta segunda-feira (22), o projeto de lei do vereador Zezinho Sabará (DEM) que faz da data de 25 de novembro o Dia Municipal de Combate ao Feminicídio. O debate em plenário tomou quase duas horas da sessão, por causa de opiniões sobre a legalidade do projeto (005.00082.2020 com emenda 035.00013.2020), uma vez que já há lei estadual sobre o tema e norma de 2008 proíbe essa “duplicidade”, e de uma opinião contrária ao uso do termo feminicídio (confira aqui o debate na íntegra).
“O objetivo é que nesta data a Prefeitura de Curitiba possa intensificar a campanha de prevenção e de combate ao feminicídio, conscientizando a população. Esse projeto passou pelas comissões competentes da CMC, que autorizaram a votação. A escolha de 25 de novembro é baseada na escolha da ONU [Organização das Nações Unidas] de fazer desta data o Dia Internacional para a Eliminação da Violência Contra as Mulheres”, justificou Zezinho Sabará. Ele pediu o engajamento da sociedade civil organizada e das igrejas para ampliar a rede de proteção às mulheres.
“Eu moro numa região periférica da cidade há 35 anos e as reclamações aqui [de casos de violência contra mulheres] acontecem quase todos dias. A gente não pode ficar calado diante dessas situações, que afetam a população. A Lei Maria da Penha ajudou muito, mas ainda falta celeridade nas investigações. Às vezes, a mulher denuncia e não são tomadas providências, daí depois é espancada, é assassinada. Quando ela procura ajuda e faz a denúncia, devia ter acompanhamento”, relatou o autor. O projeto retorna à pauta na próxima segunda- feira, dia 1º de março, para votação em segundo turno.
Legalidade da proposta
A vereadora Amália Tortato (Novo) ponderou que já existe no Paraná a lei estadual 19.873/2019, que fez da data de 22 de julho o Dia Estadual de Combate ao Feminicídio, logo aprovar o projeto de lei, que sugere a mesma ação, mas no dia 25 de novembro, incorreria numa duplicidade. A parlamentar acrescentou que, mesmo sendo favorável à matéria no seu mérito, há a lei municipal 12.670/2008 que proíbe, em Curitiba, “a instituição de data comemorativa no Município quando houver previsão no mesmo sentido na legislação estadual ou federal”.
“Não vamos dividir forças?”, Amália Tortato questionou, perguntando “se é necessário termos mais uma lei municipal, sendo que há uma [estadual] semelhante e outra que veda esse tipo de iniciativa [em duplicidade]”. A réplica veio da vereadora Maria Leticia (PV), para quem não há leis demais quando se trata de proteger os direitos das mulheres. “Se existir mil leis, que venham! Pois precisamos combater o ódio às mulheres”, afirmou a vereadora, que criticou a misoginia estrutural na sua fala.
“O feminicídio não deve ser debatido somente pelas mulheres e pelos movimentos de mulheres, mas pelos homens também”, disse a vereadora Professora Josete (PT), que, após felicitar o autor do projeto, e reconhecendo a questão colocada por Amália Tortato, sugeriu que a matéria seja aprovada em primeiro turno, com a elaboração de uma emenda até a semana que vem para dirimir qualquer ilegalidade técnica na proposta. “A maioria dos homens é contrária à violência e ao feminicídio. A sociedade precisa reagir a isso”.
Desse debate, surgiu uma interpretação em plenário da lei 12.670/2008 por meio da qual a vedação se dá somente em casos “comemorativos”. O ex-presidente da CMC, Sabino Picolo (DEM), argumentou que o projeto não é de celebração, mas de enfrentamento, logo não estaria abarcado pelo controle exigido pela regra de 2008. A opinião foi apoiada pelo autor, Zezinho Sabará, e por Noemia Rocha (MDB), que sugeriu emendar essa lei antiga para diferenciar nela a “comemoração” do “enfrentamento”. “Cabe bem esse novo entendimento, neste sentido que não se trata de data comemorativa”, apoiou Osias Moraes (Republicanos).
No debate, Professor Euler disse ter compreendido a opinião de Amália Tortato sobre o problema da duplicidade e que não via isso como crítica ao teor do projeto, “de máxima importância”. Para Marcelo Fachinello (PSC), se uma emenda fosse apresentada, deveria ser considerada a unificação das datas municipal e estadual, para fortificar os esforços de conscientização. João da 5 Irmãos defendeu que haja divulgação dos canais de denúncia existentes, como o Disque 180, da Central de Atendimento à Mulher, do governo Federal, e a Casa da Mulher Brasileira, além de ações nas escolas.
O termo “feminicídio”
Diante da discussão sobre a legalidade da proposta, ficou em segundo plano uma discussão colocada por Eder Borges (PSD), que pediu a mudança do nome dado à data em discussão, sugerindo que em vez de “Combate ao Feminicídio” fosse usada “Dia Contra a Violência Contra a Mulher” ou equivalente. Ao se justificar, disse que o feminicídio existe no Código Penal desde 1940 como homicídio qualificado por motivo torpe, com pena semelhante, logo seria “redundante”, apenas mais “um instrumento do politicamente correto”, “meramente ideológico”.
A fala de Borges foi criticada por Maria Leticia e pela Professora Josete, que criticou especificamente a interpretação que bastaria o Código Penal. “A maioria dos juízes não entendia o feminicídio como homicídio qualificado, não entendia o assassinato de uma mulher pelo simples fato de ser mulher, ou pelo seu companheiro achar que é dono do corpo dessa mulher, e que por isso se justificaria a violência. Não basta ter lei se a cultura não possibilita a aplicação adequada dela”, rebateu a parlamentar.
Sete feminicídios em 2020
Segundo levantamento da Secretaria de Estado da Segurança Pública (Sesp) do Paraná, dos 180 homicídios registrados em Curitiba de janeiro a setembro de 2020, 7 foram caracterizados como feminicídio (2 no Atuba, 1 no Cajuru, 1 no CIC, 1 no Tatuquara, 1 no Sítio Cercado e 1 no Alto Boqueirão). Há, contudo, a questão da subnotificação dos casos, como aponta o Atlas da Violência, elaborado pelo Forum Brasileiro de Segurança Pública. “Entre 2013 e 2018, ao mesmo tempo em que a taxa de homicídio de mulheres fora de casa diminuiu 11,5% [no Brasil], as mortes dentro de casa aumentaram 8,3%, o que é um indicativo do crescimento de feminicídios”, diz a edição mais recente do estudo (confira aqui).
Matéria: Câmara Municipal de Curitiba
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