A Câmara Municipal de Curitiba (CMC) retomou, nesta terça-feira (2), o debate sobre as medidas mais restritivas em função da pandemia, implementadas na última sexta-feira (26). Em pronunciamentos desde o início da manhã, no espaço chamado pequeno expediente, às falas nos últimos minutos da sessão remota, o grande expediente, passando por intervenções em meio à discussão de projetos de lei, o enfrentamento à Covid-19 foi abordado por 13 dos 38 vereadores. Entre posicionamentos contrários e favoráveis aos decretos estadual e municipal, a suspensão das aulas presenciais, as aglomerações no transporte coletivo e os impactos econômicos das restrições foram os temas mais citados.
Para o líder do prefeito na Casa, Pier Petruzziello (PTB), o momento não é de “crítica pela crítica” ou de “discurso ideológico”, e sim de “paz política” e de serem propostas soluções aos impactos da pandemia. À população, pediu “consciência” no atendimento aos protocolos sanitários. Segundo o vereador, o Executivo municipal adotou as medidas do decreto estadual “em solidariedade à região metropolitana”, que depende de leitos SUS da capital. “O que vai salvar é a vacina, isso não tenho dúvida”, defendeu. “Nós temos dinheiro para comprar e precisamos que o governo federal também corra com isso.”
O líder nega que a rede pública de saúde da cidade tenha colapsado. Conforme Petruzziello, o Município investiu R$ 2,2 bilhões no enfrentamento à pandemia, entre recursos próprios e da União: “É muito dinheiro, é muita economia”. Ele disse que o SUS da capital possui 378 leitos de UTI exclusivos para a Covid-19 e outros 486 leitos clínicos.
Em resposta a Denian Couto (Pode), que questionou uma eventual prorrogação do decreto municipal, válido até as 5 horas do dia 8 de março, o líder afirmou que a decisão da Prefeitura de Curitiba depende da avaliação de resultados das medidas implementadas. “O prefeito também está ansioso para reabrir escola, para que a vida funcione normal”, declarou.
Transporte coletivo
“No horário de pico Curitiba tem a frota integral”, disse Pier Petruzziello ele sobre os ônibus, outra questão levantada no debate. Em sua avaliação, “é muito fácil mostrar as imagens” de aglomerações no transporte coletivo sem se considerar o impacto dos usuários da região metropolitana. O parlamentar também ponderou que grandes cidades ao redor do mundo têm problemas com a lotação do transporte em horário de pico.
As aglomerações no transporte coletivo foram levantadas inicialmente por Ezequias Barros (PMB): “O ônibus lotado não transmite o vírus, mas a igreja com 15% [proposta de lotação] transmite o vírus”. “Nós precisamos rever essa situação. Todas as vezes que a cidade busca de alguma forma algum fechamento, a igreja é a primeira”, reclamou o vereador, contrário também a restrições no comércio, como o não funcionamento dos supermercados aos domingos, na capital Para ele, não é justo “punir aqueles que estão fazendo corretamente, aqueles que estão cuidando” e que se trate as igrejas com “descaso”.
“Parece que há uma contradição em algumas falas. Ao mesmo tempo que alguns cobram a abertura de espaços, falam em aglomeração”, respondeu Professora Josete (PT). “Temos que restringir sim o trânsito das pessoas e a saída das pessoas de casa. Se os ônibus estão superlotados e são foco de infecção, isso não justifica abrir outros espaços. Ao contrário, temos que cobrar do poder público que eles não andem lotados. A preservação da vida das pessoas, isso tem que estar em primeiro lugar.”
Além de voltar a criticar o aporte municipal às concessionárias do transporte coletivo, ela disse que a Urbs não apresentou dados requisitados em pedido de informações oficiais de sua iniciativa (062.000758.2020). No requerimento, a vereadora trata das frotas em circulação na pandemia, do número de passageiros, do quilômetro rodado e do custo do sistema, dentre outros questionamentos. Ela pediu a realização de uma audiência pública urgente, conjunta entre as comissões de Urbanismo e de Serviço Público, para o debate das aglomerações nos ônibus, com gestores da Urbs e do Município.
“Nós não podemos aceitar isso [ônibus lotados] como algo absolutamente normal, porque não é normal. Ou sabemos a situação do transporte coletivo ou vamos ficar na nuvem”, avaliou Denian Couto. O vereador considera que “falta clareza nos leitos de UTI [SUS]” e que a audiência pública com a secretária municipal, Márcia Huçulak, na semana passada, “serviu muito pouco”. “Ela gastou a maior parte do tempo cumprimentando as pessoas da equipe. Depois abrimos a palavra a pessoas que sequer se identificam nas redes sociais”, reclamou.
A preocupação central, defendeu Dalton Borba (PDT), deve ser a prevenção de novos casos, frente aos números de lotação dos leitos SUS em todo o Paraná. “A gente tem que evitar que as pessoas tenham que ir aos hospitais. E como faz isso? Com o reforço das políticas de distanciamento, de uso de máscaras.” “Sobre as competências do Município, a matéria está bem sedimentada. O Município tem condições sim de legislar com autonomia no que diz respeito à Covid”, pontuou.
Comércio e fiscalização
“Nós não podemos fechar os olhos àquilo que atinge setor econômico. A economia é vida. Porque ela que leva o prato de comida para dentro de casa”, acrescentou Denian Couto. Marcelo Fachinello (PSC), por sua vez, citou pedido de informações oficiais de sua iniciativa, apresentado nessa segunda-feira, sobre o fechamento das academias (062.00108.2020). O vereador lembrou que a atividade física foi incluída, pela lei municipal 15.802/2021, de autoria de Pier Petruzziello, no rol de serviços essenciais. “Só que hoje infelizmente essa lei não está sendo cumprida.”
“Nós aqui [na CMC] nos adaptamos, reduzimos o número de pessoas em gabinetes. Isolamos, para que trabalhem em casa, aqueles que estão em algum grupo de risco, e estamos cumprindo os protocolos”, disse Fachinello sobre a manutenção das atividades na CMC. Quanto às atividades fechadas pelos decretos, como as academias, o vereador argumentou que “a gente não pode penalizar quem está trabalhando dentro da lei”. “É evidente que a prática esportiva aumenta a resistência”, completou, sobre o fortalecimento do sistema imunológico. “A gente precisa acabar com o que é clandestino. Festas, aglomerações.”
Para Toninho da Farmácia (DEM), o agravamento da pandemia não é culpa do poder público, e sim de quem não obedece às leis e decretos vigentes. Os mais prejudicados, alertou, são “os comerciantes, os cidadãos que precisam trabalhar para ganhar o sustento de suas famílias”. “Precisamos da colaboração de todos”, pediu, além de cobrar mais rigor na fiscalização do uso da máscara e de outros protocolos.
“Eu tive Covid [em 2020], quase morri de Covid. Passei 9 dias com oxigênio, não conseguia respirar. Minha filha teve Covid, ela está com Covid novamente, ela não está bem, está muito mal”, relatou Noemia Rocha (MDB). “Aí você repensa a questão de impacto da saúde. Não dá para a gente pensar no impacto econômico acima do impacto à vida. Sou mãe, estou sentindo na pele.”
Segundo Eder Borger (PSD), Curitiba recebeu, até dezembro passado, R$ 390 milhões do governo federal para o enfrentamento à pandemia. “Eu gostaria de saber por que está faltando leitos? Por que estamos a ponto de faltar leitos com tanto dinheiro em caixa?”, indagou ele, contrário à “indústria da multa” e ao fechamento do comércio e de outras atividades. O vereador ainda defendeu o presidente Jair Bolsonaro, “impedido de agir”, e disse que a culpa da “infestação viral” não é da população. “Lockdown não é, definitivamente, ciência”, acrescentou.
Na opinião de João da 5 Irmãos (PSL), a CMC poderia criar uma comissão especial e vistoriar o transporte coletivo, o comércio e outros espaços da cidade. “Temos que estar na linha de frente. Temos que escutar os comerciantes, as pessoas”, pontuou. “A gente sofre a terceira onda, infelizmente. Temos que nos atentar [priorizar] isso. É muito importante agora.”
Carol Dartora (PT) rebateu as críticas ao que chamou de “criminalização da palavra ideologia” e a uma incitação da polarização do debate. “Ideologia significa conjunto de ideias. Não tenho vergonha de ter ideologia. Eu tenho muitas ideias, sou uma professora de História, mestre em Educação”, argumentou. “A gente não pode criminalizar a política. A ideologia é que fundamenta nossos passos”, complementou Professora Josete.
Apesar de considerar a ideologia importante, Alexandre Leprevost defendeu que o momento é de bom-senso e de união, conforme a fala do líder. “Não podemos perder tempo com posicionamentos políticos. Acho que a gente tem que ter objetividade e eficiência”, opinou. “A questão dos ônibus, por exemplo, por mais que a prefeitura tenha feito esforços para que isso não aconteça [aglomerações], temos juntos que buscar soluções. Temos juntos que buscar soluções aos empresários”, citou.
“Pela ordem”
“A Secretaria Municipal da Saúde recebeu, em fevereiro, 93 pedidos de informação. É um número alto, considerando que mais de 60% desses pedidos estão no site da prefeitura e estão também no site da secretaria”, argumentou Pier Petruzziello, em meio à discussão de projeto de lei de sua iniciativa. Na semana passada, em audiência pública na CMC, a secretária Márcia Huçulak pediu que os gabinetes acessem o Painel Covid-19, no Portal da Transparência da prefeitura, para terem acesso à maior parte dos dados.
“É um mecanismo que a Câmara tem para dar satisfação à população, mas a gente pede também um pouquinho de bom-senso nosso, dos 38, para que a gente possa fazer esses pedidos de informação, aqueles que não estão no Painel [Covid-19], no site”, justificou. Em resposta a algumas dessas informações, o vereador afirmou 125 mil crianças estão recebendo os kits merenda, que os Centros de Referência da Assistência Social (Cras) distribuem cestas básicas às famílias em situação de vulnerabilidade, que os restaurantes populares não foram fechados e que os cidadãos temporariamente impactados pela pandemia podem se cadastrar e ter acesso aos Armazéns da Família, com produtos mais baratos.
“Os ônibus estão sendo desinfetados suas vezes por dia, ao meio-dia e pela madrugada”, continuou Petruzziello. A apresentação das informações foi suspensa, e depois retomada no grande expediente, a pedido de Professora Josete. Com base no Regimento Interno, porque a a discussão havia saído do projeto em pauta, ela se manifestou “pela ordem”.
“Nós vivemos hoje um absurdo. Já vivemos isso ontem. Agora sequer conseguimos saber o que o líder traz, por conta de uma mera formalidade”, declarou Denian Couto, que nessa segunda já havia proposto o adiamento dos projetos e demais proposições em pauta para a discussão dos decretos. Para ele, “o plenário é soberano”. “Discutir pandemia não se consegue. Não se consegue discutir o que é importante.”
Alexandre Leprevost concordou que “devemos focar neste assunto na Câmara”, mas ponderou que existem outros horários, fora da ordem do dia, para o debate de temas relevantes à cidade, como o pequeno e o grande expediente, nos quais os vereadores se inscrevem. No entanto, como a fala do líder era de prestação de contas sobre requerimentos dos vereadores, disse acreditar que “cabe o bom-senso” quanto ao “pela ordem”.
“O Regimento para nós é uma peça muito importante, um instrumento muito importante. É ele que garante a democracia e o direito de todos os vereadores”, respondeu Professora Josete. “A gente às vezes cria falsas polêmicas. Nenhum vereador está sendo cerceado de seu direito de debater, a pandemia é o tema central neste momento, mas a Casa não pode parar.”
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