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TRE cassa mandato de prefeito do interior e convoca nova eleição

 Reeleitos com 49,15 % dos votos na eleição do ano passado, o prefeito e o vice foram cassados por infringir a Lei das Eleições

O Tribunal Regional Eleitoral do Paraná (TRE) determinou a convocação de novas eleições na cidade de São João, sudoeste do Paraná, após decidir pela cassação do mandato do prefeito Clóvis Mateus Cuccolotto (PSD) e do vice Valdir Wiesenhutter (PL) por abuso de poder de autoridade e econômico.

Os dois ainda tiveram a inelegibilidade decretada pelo período de oito anos a partir do pleito de 2024 . Cabe recurso da decisão ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Clóvis foi reeleito com 49,15 % dos votos na eleição do ano passado.

A condenação é fruto de uma AIJE (Ação de Investigação Judicial Eleitoral) que apurou a suspeita da utilização desenfreada do programa “Frente de Trabalho”, que teria promovido sucessivas contratações temporárias, iniciadas em janeiro de 2022, prorrogando-se a cada 90 dias, sendo encerrada somente em setembro do mesmo ano após determinação judicial.

A cada renovação, cita a sentença, o valor despendido era de R$ 213,7 mil — totalizando mais de R$ 2 milhões ao longo dos dois anos. E no período eleitoral, o volume de pessoas contratadas aumentou significativamente.


“O Programa Frente de Trabalho foi usado como forma de obter mão de obra – e não como um programa social. E é evidente a falta de finalidade eleitoral para tal desvio: Isso vinha ocorrendo desde 2022 e não havia um rodízio das pessoas beneficiadas, sendo sempre as mesmas pessoas contratadas (com renovações sucessivas), de acordo com o ‘melhor serviço prestado’. Se houvesse finalidade de se beneficiar eleitoralmente direta pelo Programa, é certo que os demandados fariam alta rotatividade de pessoas, a fim de contemplar o máximo de eleitores possíveis e, assim, angariar mais votos. Porém, isso não restou comprovado – pelo contrário”.

Prefeito e vice se defenderam insistindo na tese de que as atividades seriam essenciais e que, caso não se valessem das contratações temporárias, esses serviços ficariam paralisados. Mas a justificativa não colou junto aos desembargadores do TRE.

O relator, José Rodrigo Sade, rebateu a tese do prefeito e do vice pontuando que em apenas dois decretos, ambos de 2024, eles puderam contratar 25 pessoas por dia para trabalhar na função de auxiliar de serviços gerais – função essa que deveria ser desempenhada por servidores concursados e que não se enquadram no conceito de serviços essenciais. Estas contratações perduraram por dois anos.

“O Município de São João, seja por desorganização, incompetência ou dolo de improbidade administrativa, NÃO REALIZOU SUFICIENTEMENTE processos de contratação”.

O desembargador cita a Lei das Eleições que veda agentes públicos “nomear, contratar ou de qualquer forma admitir” nos três meses que antecedem o pleito até a posse dos eleitos. E salienta que a imensa maioria dos trabalhadores foram contratados para atividades corriqueiras, descritas nos próprios decretos como “braçais” e condizentes com o cargo de “auxiliar de serviços gerais” — atividades que não são entendidas como essenciais.

No entendimento do TRE, o prefeito e vice na condição de gestores municipais, “atuaram efetiva e deliberadamente para causar a falta de servidores suficientes para atender às demandas cotidianas do município”.

E pior: “não realizaram concursos públicos para atender a essa necessidade; extinguiram cargos públicos de auxiliar de serviços gerais”, cita o relator na sentença, “justamente a atividade para a qual contrataram centenas de pessoas por meio das frentes de trabalho; aumentaram significativamente o número de pessoas contratadas por dia no ano eleitoral e, notadamente, no período eleitoral proscrito, chegando ao cúmulo de extrapolar os limites impostos pelos decretos que instituíram as frentes e sobrepondo as vigências de decretos que, a título de ‘prorrogar’ a frente anterior, iniciavam a sua vigência antes do fim da vigência do decreto anterior”.

Para José Rodrigo Sade, ficou demonstrado que o prefeito Clóvis Mateus Cuccolotto e o vice Valdir Wiesenhutter criaram as condições, ao longo de todo o seu mandato, para que houvesse a falta de servidores para atividades básicas do município e, no ano eleitoral, ampliaram o número de pessoas contratadas para o programa “Viver Melhor” com a finalidade de prestarem serviços cotidianos do município, em prejuízo à regra constitucional que exige a contratação por meio de concurso público.

“Não apenas houve o desvio de finalidade do programa Viver Melhor, em especial quanto à utilização das suas frentes de trabalho para atividades não essenciais, típicas de servidor público, mas que esse desvio foi construído ao longo do tempo, com aumento significativo no período eleitoral, com aptidão para influenciar negativamente o equilíbrio na disputa eleitoral. Assim, o abuso do poder de autoridade resta plenamente configurado e, pelo montante de recursos investidos irregularmente, também o abuso de poder econômico. Portanto, com base na constatação do abuso de poder, é de se cominar aos investigados a sanção de inelegibilidade para as eleições a se realizarem nos oito anos subsequentes à de 2024 e cassar-lhes os diplomas. De consequência, convocar novas eleições para o município de São João”.

E o ilícito julgado pelo TRE não parou por aí. Prefeito e vice teriam feito, de forma ilegal, a distribuição gratuita de copos térmicos tipo “Stanley” no programa de saúde masculina “Agosto Azul” — o que é vedado pela legislação eleitoral. Os dois ainda teriam feito uso de serviços públicos em favor de particulares.

A única “vitória” do prefeito e do vice de São João no TRE foi a redução da multa aplicada de R$ 100 mil para R$ 50 mil.

Mas a situação pode piorar com a abertura de uma nova AIJE já que, após a eleição de 2024, prefeito e vice republicaram um edital no valor de quase R$ 430 mil para a contratação de pessoal, mas com uma novidade: a obrigatoriedade de pejotização. E até dezembro do ano passado, mais de 40 “empresas” se credenciaram — eram na verdade pessoas físicas que abriram microempresas individuais – MEI – para se adaptarem às condições do edital.

A função oferecida é a de auxiliar de serviços gerais, exatamente aquela que os investigados extinguiram nos quadros de servidores da prefeitura.

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